29/12/2020

Opinião | "Memória de Uma Cor" de Rosie Price

 

Iniciei esta leitura com altas expetativas e é uma história que sim deve ser lida e discutida devido ao tema principal, mas só! Infelizmente este livro apenas aborda o tema e algumas consequências desse ato e fica por aqui. Tudo o resto é apresentado ao leitor apenas para preencher "espaço", sem necessariamente ser importante ou relevante para a história. Desiludiu-me porque estava à espera de um livro forte e intenso sobre um tema que hoje infelizmente ainda é tabu e que muitas vezes a vítima esconde por medo de ela própria ser acusada e a verdade é que este livro não veio trazer nada de mais.

Em Memória de Uma Cor conhecemos a Kate, uma jovem que acaba de entrar na faculdade e logo num dos primeiros dias o Max entra pelo quarto da Kate. Logo aí ficam grandes amigos e se a personalidade calma da Kate ajuda o Max a ficar mais presente e calmo, já a atitude marcante do Max ajuda a Kate a ser mais descontraída e a vencer a sua timidez. Ao longo dos anos esta amiga fica cada vez mais forte e ficam grandes amigos. Mas numa festa a Kate é violada e ela muda completamente.

A vida desta jovem é completamente desfeita após ser violada e a partir daí vamos ver todas as consequências físicas e emocionais que este acontecimento teve na sua vida. O livro deveria ter focado apenas e só na Kate, mostrar o que ela sentia, o que ela pensava e como ela tentava lidar com a situação. Mas não, temos capítulos de personagens completamente aleatórias e sobre o passado destas que nada vêm a acrescentar à história e que só tornou a leitura cansativa. Tudo é tratado de forma aleatória e rápida o que faz que não consigamos ter qualquer empatia pelas personagens e muito menos emocionarmos com o que está a acontecer.

A escrita da autora é talvez o grande problema deste livro. Penso que o que a autora quis fazer era que o leitor tivesse a sua própria opinião sem interferência dos pensamentos dos personagens, mas não fez isto corretamente, pelo contrário. Como está escrito faz com que o leitor não tenha qualquer envolvimento com os acontecimento e, devido à rapidez dos acontecimentos, até perdemos alguns acontecimentos. Logo no início não sabemos quase nada sobre os personagens e o pouco que sabemos é que são x, logo depois mudam completamente e não percebemos como houve esta mudança, simplesmente a autora manda "para o ar" e o leitor que "apanhe se conseguir".

Para mim, não foi a melhor escolha para contar esta história. Um simples exemplo é que no momento em que a Kate está a ser violada eu não senti nada, uma cena destas deve ser marcante e forte para mostrar o quanto este acontecimento é terrível para a vítima e a forma como Price escreveu não trouxe nada ao leitor. Outro exemplo é quando a Kate tem episódios do trauma o leitor não tem qualquer empatia e não entende o porquê do personagem estar a fazer aquilo. Estes são apenas alguns exemplos, temos muitos outros ao longo do livro, não sei se foi algo que a autora fez de propósito ou se ela não sabe transmitir sentimentos, mas não gostei e fiquei bastante desiludida.

O próprio Max é para mim uma figura estranha, pensava que ele fosse mais importante na história e afinal de contas é apenas o amigo que está lá de vez em quando. Não estou a falar de romance, mas sim ele ser um pilar importante para a Kate e uma personagem que a poderia verdadeiramente ajudar e isso simplesmente não acontece. Afinal para quê ter este personagem? A autora poderia ter descrito uma violação numa festa da faculdade e seria exatamente o mesmo. Não senti que houve necessidade de apresentar todos aqueles personagens uma vez que estes não são o importante, nem relevantes, para a história.

Agora vamos falar de coisas positivas (sim também tem algumas xD). Primeiro é a incrível amizade entre a Kate e o Max, desde que ele entrou no quarto dela tiveram uma amizade linda e foi incrível ver essa amizade por tantos anos. Admito que estava com medo que a autora levasse para algo mais, mas felizmente (e talvez a única coisa acertada que fez) é que manteve os dois como melhores amigos e só. Conhecem aquela típica frase "rapariga não pode ser amiga de rapaz" e que para mim é uma estupidez e achei lindo a amizade dos dois. Outro aspeto que gostei é que o tema da violação tem que ser cada vez mais discutido. Principalmente nos dias de hoje e pelo menos isso temos e a autora abordou de uma forma interessante em que a Kate decide não contar a verdade. Temos que pensar que a vítima sofreu algo horroroso que lhe tirou o direito de escolha, ao decidir não contar é a forma de a vítima ter um poder naquilo que pretende fazer. O problema é todas as consequências que isso traz e, pelo menos isso foi bem retrado, apenas mais de forma informativo do que propriamente a mostrar ao leitor (novamente, devido à rapidez com que tudo é contado), mas pelo menos temos algo novo e interessante que deve sim ser pensado e discutido. Até que ponto a vítima tem que contar? Cada um sofre de maneiras diferentes e temos que aceitar as escolhas, mesmo de uma vítima de um caso como este.

Concluindo, é um livro que tinha um potencial enorme e que estava com altas expetativas e no final apenas foi bastante aborrecido. Mesmo assim, acho que sim, que deve ser lido, porque traz uma visão diferente da vítima. É um livro onde a vítima não escolha o caminho certo de fazer as coisas, mas sim o mais habitual e temos que aceitar. 

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